sexta-feira, 26 de julho de 2013

Brasil


Pré-requisito: Nenhum

Autor: Gustavo Spina

Há mais de quinhentos anos, os europeus estavam prestes a encontrar um novo pedaço de terra. Assim é, sucintamente, como conhecemos o início da história deste país, até hoje, em todo o mundo. Mas sabemos que não é bem assim. Neste texto, através de uma discussão bastante detalhada sobre (quase) tudo o que aqui foi feito, durante esses pouco mais de quinhentos anos, bem como suas consequências, nós faremos o que Cabral nunca fez: DESCOBRIR O BRASIL!

Ao gritar “terra à vista”, o que os europeus viram, foi nada menos que nosso querido Brasil, apesar de estar longe de ser nosso, e mais longe ainda de ser querido. Se o senhor Joaquim Osório Duque Estrada pudesse reescrever o hino nacional nos dias de hoje, muitas mudanças seriam necessárias: Nosso povo está longe de ser heroico e há décadas já não se ouve o brado retumbante. O sol da liberdade não nasce para todos, e tampouco possuímos o penhor da igualdade. Nosso céu já não é mais tão risonho e límpido, e, dessa forma, dificilmente podemos ver a imagem do Cruzeiro. Gigante ainda somos, mas não mais pela natureza, e apesar desta terra ainda ser garrida, nossos campos perderam muito das suas flores e nossos bosques perderam muito da sua vida. Além do mais, os filhos teus dificilmente vão à luta por esta terra, que infelizmente, está longe de ser uma pátria amada.

Mas por que toda essa mudança? Qual foi o processo? A discussão é longa e bastante delicada, mas a chave de tudo está bem aqui, como neste texto, no começo! Quando os índios receberam os afoitos europeus, não imaginavam de quem eles estariam sendo anfitriões. Para aquela época, totalmente diferente da atual em todos os aspectos, inclusive comercialmente, aquele grande pedaço de terra que os europeus acabaram de encontrar era o verdadeiro paraíso. Com uma grandiosidade e beleza natural incomparável, o Brasil era uma fonte de riquezas quase que inesgotáveis, a solução econômica para quem conseguisse explorá-lo o mais feroz e rapidamente possível, e assim foi feito.

Europeus de todos os lados, principalmente portugueses e espanhóis, começaram então a sua caça ao tesouro, fazendo a única tarefa que o ser humano sempre soube fazer de melhor: destruir. Infelizmente, e isso já nos é óbvio, a mentalidade humana não nos surpreendeu e agiu de forma natural, esbanjando ganância, desejo pelo poder e pela posse, acima de qualquer coisa, pouco se importando com os nativos ou com as consequências de sua desenfreada exploração. Tudo então foi mudado de lugar. A cultura nativa, as paisagens, os animais, o ouro, as plantas, o famoso “pau brasil” e todos os outros incontáveis recursos naturais que poderiam, de alguma forma, servir para as grandes indústrias da época, trocaram de lugar com grandes máquinas, novos vilarejos e pequenas cidades, mas principalmente, com uma nova cultura trazida por sua nova população, o então chamado “homem branco”.

E foi logo no início, que tudo mudou, afinal, entre outras mil, és tu Brasil, a mais roubada. O novo quintal da Europa era a terra dos sonhos. Além de trazer uma infinidade de recursos naturais, trazia também a mão de obra necessária: os índios! Bastava familiarizá-los com sua cultura, catequizá-los, ou no máximo, escravizá-los. Não precisavam também se preocupar com espaço para as grandes indústrias produzirem a todo vapor, bastava construí-las aqui. Não era mais preocupante também o excessivo número de criminosos em seus países, bastava abandoná-los em qualquer cantinho desta enorme terra. E assim tudo realmente mudou logo no início da belíssima história deste país.

É comum hoje a uma parcela da população brasileira, incluindo este que vos escreve, o auto questionamento de alguns “porquês” a respeito de nosso país, tais como porque este país é tão politicamente explorado e tão socialmente precário e decadente. Porque é tão mal aproveitado economicamente e tão malvisto interior e exteriormente, e principalmente, porque seu povo é tão passivo a tudo isso? Foi exatamente assim, buscando essas explicações em minha mente, que decidi escrever este texto, e dada a introdução histórica dos parágrafos anteriores, fica um tanto quanto mais fácil de entender tudo isso, pois nada, absolutamente NADA que começa de forma errada, acaba de forma correta.

O fato é que a base de toda a nossa história foi criada por criminosos. Não é por acaso que as primeiras partes do corpo que Cabral colocou neste país, ainda que de longe, foram seus olhos, banhados em um mar de interesses da mais alta ganância possível. Aqueles “homens brancos” destruíram a cultura natural e inocente dos índios, trocando-a pela lei da imposição, onde o mais forte explora o mais fraco. Não obstante, os governantes, que não demorariam a chegar para serem oficialmente “donos” dessa abençoada terra, eram igualmente mesquinhos e inconsequentes. Este fato por si só já explica nossa exemplar herança política. Mergulhados na cultura do roubo, da desonestidade e da exploração de tudo e de todos, gerações e gerações de governantes surgiram, e até hoje nada mudou, ficando apenas mais “mascarado” ou profissional, se preferir. Dessa forma, o Brasil possui hoje um senado de dar inveja a qualquer prisão internacional, como haveria de ser, afinal, nossas atuais leis são derivadas justamente deles, foram feitas por eles, e se preocupar com o bem da nação e de seu povo nunca foi o maior objetivo aqui.

Da mesma forma, gerações e gerações de uma impressionante miscigenação, foram exploradas por seus reis, governantes ou mesmo superiores mais diretos, como senhores de engenho ou fazendeiros donos de grandes terras, durante todas essas centenas de anos. Em uma grande mistura de negros, índios, pobres e quem mais pudessem ser escravizados, foi criada a nossa população, que hoje somam quase duzentos milhões de pessoas, e que continua sendo explorada, também de uma forma mais “mascarada”, se assim me permite dizer. No começo, o uso da força bruta e a inexistência dos direitos humanos obrigavam aqueles infelizes a aceitarem todo e qualquer tipo de ordem, se submetendo a tudo o que fosse imposto. Esta imposição sobre o povo, através do abuso de autoridade e por meio do uso da força, perdurou por muito tempo, se impregnando em nossas essências, tornando-se quase que uma herança genética, que reflete atualmente nessa aceitação apática inerente à maior parte dos atuais cidadãos brasileiros, tão impressionantemente forte, que mesmo sendo cotidianamente assolada pelo governo através de impostos e péssimo IDH, uma grande fatia da população se recusa voltar-se contra o governo, e ainda cria argumentos contrários, caso isso ocorra, enquanto outra grande fatia se preocupa mais com seus “reality shows” prediletos ou com seu time de futebol do coração.

Tudo isso não é tão simples quanto descrito, porém, nem tão complicado quanto parece. Como disse há pouco, nada que começa errado, acaba certo, e um país inteiro não foge a essa regra quase infalível. Infelizmente, bem mais difícil do que entender as razões de nossa atual situação, é modificá-la. Por se tratar de heranças históricas, fica quase impossível desfazer essa cultura do roubo, desonestidade e impunidade a qual vivem nossos governantes, bem como a ampla cultura da aceitação e conformismo a qual vive nossa população. Portanto não será em um, dez ou cinquenta anos que vamos mudar os padrões e consertar a bagunça que têm sido feita há mais de quinhentos. Uma gloriosa “solução” para o país é sempre balbuciada por um ou outro cidadão brasileiro inconformado, em diárias discussões de bares, entre amigos ou em grupos que debatem sobre questões sociais, principalmente sobre a questão política. Mas será que é mesmo possível que exista uma grande e milagrosa solução, que realmente transforme o Brasil e nos coloque no patamar de um país de primeiro mundo? Alguns fatores indicam que não, e serão apresentados e discutidos nos próximos parágrafos.

Quando o governo reproduz seu famoso slogan “BRASIL: UM PAÍS DE TODOS”, por incrível que pareça, ele está certíssimo. O Brasil é um dos poucos países com uma enorme, senão a maior, miscigenação de todo o planeta, seja ela de povos, crenças, culturas, etnias, etc. Herdamos culturas e abrigamos milhões de pessoas de todas as partes do globo. Mesmo a nível nacional, devido ao fato de sermos um país verticalmente extenso, temos culturas completamente divergentes, como por exemplo, o nordeste e o sul. Seja no modo de falar, no clima, nos costumes ou culinária, tudo aqui é completamente variado, e não obstante, os interesses, objetivos e as motivações de cada um são igualmente variados.

Como tudo tem suas vantagens e desvantagens, da mesma forma que podemos provar um delicioso prato da culinária japonesa, australiana e peruana, preparados por nativos de cada um desses países, em uma mesma rua, não podemos contar com nenhuma de suas três principais clientelas para lutar por uma causa em comum, caracterizando-se, desta forma, como uma população tipicamente individualista, preocupada apenas em satisfazer seus interesses pessoais, pouco se importando com o coletivo. O que quero dizer é que, devido à grande distinção de pensamentos, crenças e culturas, fica praticamente impossível criar um senso comum, que desperte o interesse de todos, que motive e mobilize a todos, um grande ideal de luta, melhora ou mudança, que sirva ou que seja bom para todos, ideal este que seria uma das possíveis soluções para o Brasil, pois a exemplo de diversos outros países, em diversas ocasiões, sabemos que o povo unido pode conquistar (quase) tudo o que quiser.

Outro fator que indica que não exista essa tal “solução” para este país, é nossa personalidade, o modo de ser de nossa própria população. Você já deve ter ouvido falar do famoso “jeitinho brasileiro” de ser, certo? Bem, digamos que a hipocrisia e o egoísmo também são elementos bastante presentes em nosso dia a dia. Estamos sempre reclamando dos políticos e de suas atitudes, mas nunca enxergamos que temos muito daqueles políticos em nós mesmos. O que um povo que está sempre querendo levar vantagem em tudo, em todas as ocasiões, tem a dizer de seus governantes, que apenas agem exatamente da mesma forma?

Diga-me, na primeira oportunidade que você tiver de furar aquela enorme fila, ou a primeira pessoa que, sem ver, deixar cair uma nota de cinquenta reais na sua frente, quais seriam as suas atitudes? Responda com sinceridade, você está lendo isso sozinho(a), não precisa mentir. Responda agora, também, o que um cidadão que não devolve o troco a mais, recebido por engano do comerciante, tem a dizer sobre honestidade, ou o policial que aceita algumas notas para não multar um infrator no trânsito, tem a dizer sobre corrupção? Pode mesmo um povo que entope de lixo todo o seu sistema de esgotos da cidade, culpar os políticos pelas enchentes, ou aqueles que destroem e depredam a cidade, reclamarem da falta de lixeiras e telefones públicos? A desonestidade, a corrupção e a falta de caráter que tanto enxergamos em Brasília, estão, na verdade, em todos os outros estados, presentes também em mim, em você e em cada um desses cidadãos que adoram exaltar seus direitos, mas não cumprem com nenhum de seus deveres. Visto isso, a última questão que nos é pertinente, agora pode também ser respondida por você: mesmo que houver uma “solução” para o país, será que o povo brasileiro realmente a merece?

Outras problemáticas sociais presentes em nosso dia-a-dia podem também ser facilmente entendidas, apenas analisando o passado. Um ótimo exemplo é entender o porquê é tão caótico o sistema de transporte público nas grandes cidades e porque ainda temos escassez de água na região nordestina. Antes de faltar água no nordeste e espaço nos meios de transporte das grandes cidades, faltaram primeiramente aspectos como planejamento e administração em todo o país. Inicialmente, a desenfreada urbanização de poucas regiões do país, principalmente do estado de São Paulo, provocou a migração de uma enorme massa, concentrando a população em pequenas regiões, deixando também grandes regiões vazias. Ao mesmo tempo, a falta de planejamento fez com que estas mesmas grandes cidades fossem estruturadas para o número de pessoas da época, bem inferior ao de hoje. Porém, devido à própria exacerbada urbanização e concentração comercial criada inicialmente, a procura pelas melhores oportunidades presentes nos centros urbanos fez com que a migração continuasse grande e, consequentemente, o crescimento populacional foi explosivo, resultando na superlotação e insuficiência de mobilidade e transporte nessas regiões, que podemos sentir até hoje, seja esmagado nos ônibus e trens, ou engarrafado no trânsito das grandes e pequenas rodovias. Por esta mesma razão, continuou sendo investido e dada muito mais atenção para as grandes cidades, deixando de lado regiões muito maiores, como o norte e nordeste, ainda extremamente precárias em infraestrutura e qualidade de vida, resultando na vergonhosa escassez de água a qual esta ultima ainda vive atualmente.

Neste ponto da discussão, se continuarmos seguindo a mesma linha de raciocínio, podemos encontrar respostas para milhares de outras questões e problemáticas sociais, obtendo cada vez mais e mais respostas, que não só esclarecem, mas também, infelizmente, dificultam toda e qualquer tipo de proposta que visa mudança, que tenha como objetivo a melhora de todo esse grande “playground” internacional chamado Brasil, onde nós pagamos muito caro, mas quem brinca é o mundo inteiro.

Por fim, descobrimos que nada nunca mudou para nós, apenas para os pobres nativos e índios que aqui viviam há quinhentos anos. Não houve um processo ou algo que nos colocasse na situação a qual nos encontramos hoje, nós já começamos assim. Descobrimos que nossa história, assim como nosso país, foi construído e estruturado de forma errônea desde sua mais remota colonização, refletindo em centenas de anos de consecutivos problemas, os quais ainda podemos enxergar, e pelos quais sofremos as consequências diariamente. Descobrimos o porquê de tantas dificuldades em mudar tudo isso e que mesmo que esse processo de melhora seja possível, demorará outras centenas de anos para que resulte em mudanças significativas. Porém, se formos esta mudança que tanto queremos enxergar neste país, não apenas protestando contra os políticos e exigindo nossos direitos, como tem acontecido recentemente, mas também mudando a nós mesmos e cumprindo com nossos deveres como cidadãos brasileiros para que possamos merecer essa mudança, juntos, iniciaremos este longo e árduo processo de melhoria em prol do país, para que um dia todos possam realmente descobrir o Brasil, e enxergar um país mais justo e digno, para que todos possam finalmente enxergar O OUTRO LADO DA MOEDA.

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