(4x)Pátria
que me pariu!
Quem
foi a Pátria que me pariu!?
Uma
prostituta, chamada Brasil se esqueceu de tomar a pílula,
e
a barriga cresceu.
Um
bebê não estava nos planos dessa pobre meretriz de dezessete anos.
Um
aborto era uma fortuna e ela sem dinheiro
Teve
que tentar fazer um aborto caseiro.
Tomou
remédio, tomou cachaça, tomou purgante
Mas
a gravidez era cada vez mais flagrante.
Aquele
filho era pior que uma lombriga
E
ela pediu prum mendigo esmurrar sua
barriga.
E
a cada chute que levava o moleque revidava lá de dentro
Aprendeu
a ser um feto violento.
Um
feto forte escapou da morte
Não
se sabe se foi muito azar ou muita sorte
Mas
nove meses depois foi encontrado, com fome e com frio,
Abandonado
num terreno baldio.
(4x)Pátria
que me pariu!
Quem
foi a pátria que me pariu!?
A
criança é a cara dos pais mas não tem pai nem mãe
Então
qual é a cara da criança?
A
cara do perdão ou da vingança?
Será
a cara do desespero ou da esperança?
Num
futuro melhor, um emprego, um lar
Sinal
vermelho, não da tempo pra sonhar
Vendendo
bala, chiclete...
"Num fecha o vidro que eu num
sou pivete
Eu não vou virar ladrão se você me der
um leite, um pão, um vídeo game e uma televisão, uma chuteira e uma camisa do mengão.
Pra eu jogar na seleção, que nem o
Ronaldinho
Vou pra copa, vou pra Europa..."
Coitadinho!
Acorda
moleque! Cê num tem futuro!
Seu
time não tem nada a perder
E
o jogo é duro! Você não tem defesa, então ataca!
Pra
não sair de maca!
Chega
de bancar o babaca!
Eu não aguento mais dar murro em ponta
de faca
E tudo o que eu tenho é uma faca na
mão
Agora eu quero o queijo. Cadê?
Tô cansado de
apanhar. Tá na hora de bater!
(4x)Pátria
que me pariu!
Quem
foi a pátria que me pariu!?
Mostra
tua cara, moleque! Devia tá na escola
Mas
tá cheirando cola, fumando um beck
Vendendo
brizola e crack
Nunca
joga bola mais tá sempre no ataque
Pistola
na mão, moleque sangue bom
É
melhor correr porque lá vem o camburão
É
matar ou morrer! São quatro contra um!
Eu me rendo! Bum!
Clá! Clá! Bum! Bum! Bum!
Boi
,boi, boi da cara preta pega essa criança com um tiro de escopeta
Calibre
doze na cara do Brasil
Idade
14, estado civil morto
Demorou,
mas a pátria mãe gentil conseguiu realizar o aborto.
(4x)Pátria
que me pariu
Quem
foi a Pátria que me pariu?
O povo brasileiro, entre muitas
outras icônicas características, tem a incrível capacidade de crer
apaixonadamente em contradições. E não estou falando das maiores e mais
complicadas contradições que o ser humano insiste em acreditar, como crer ao
mesmo tempo em um Deus onisciente e onipotente e em um Demônio autônomo; são
contradições ainda mais simples de se identificar.
Por aqui, as pessoas que
frequentemente saem nas ruas para levantar suas bandeiras “anti-aborto”, são as mesmas que, em qualquer conversa informal em
família ou oportunidade de se expressar nas redes sociais, clamam pela
diminuição da maioridade penal e comemoram com a morte diária de jovens
marginais e delinquentes. A hipocrisia provinda da doutrina cristã, de um amor
puro, falso e frágil, é responsável pelos princípios desta ideia, onde no
primeiro caso leva as pessoas a serem “pró-vida”,
mas no segundo, a defesa da vida dá lugar a um senso de justiça totalmente
desprovido de lógica. Uma crença contraditória gerada por uma doutrina
contraditória.
Este senso de justiça que faz com
que essas pessoas não percebam que estão se apaixonando por mais uma
contradição, se baseia na ideia de que, no caso do feto, estamos tratando de
uma vida totalmente inocente, e no caso do adolescente, estamos tratando de um
criminoso que deve ser punido da forma mais severa possível por sua pátria. Falta
a estas pessoas, então, analisar um pouco melhor o que ocorreu neste intervalo
de pouco mais de dez anos.
Nascer, ele nasceu. Mas o
problema está longe de ser resolvido, de fato, ele está só começando. Não tem pai
nem mãe, cresceu criado pela sua pátria. Sua pátria, por sua vez, não foi capaz
de lhe proporcionar condições mínimas de sobrevivência: alimentação, segurança,
saneamento básico e educação. Este problema endêmico do país, acontece há
décadas, senão séculos, daí o motivo de ter sido abandonado por sua mãe
biológica, que provavelmente nem sabia quem era o pai daquela criança, em um
terreno baldio, ao nascer.
Para ele não tem leite, não tem
pão, videogame, televisão, chuteira nem camisa de futebol. Uma das suas únicas
companheiras é a fome, mas o que é que se pode fazer para conseguir alguns
trocados, já que a mesma sociedade que defendeu seu nascimento é a primeira a
se recusar a dar alguma oportunidade para um pivete, favelado? Até mesmo o
mísero assistencialismo social promovido por alguns governos para diminuir esta
triste desigualdade social é alvo de crítica destas pessoas detentoras da
religião do amor e da caridade.
Com sorte, em vez de já leva-lo
para o caminho mais fácil, mais acessível, do vício ou do tráfico de drogas,
que mascara sua realidade por um tempo maior ou que lhe retorna uma quantia
maior em dinheiro; seu destino pode leva-lo a vender bala, chiclete, ou fazer
malabarismos nos semáforos em troca de algumas moedas. Mesmo tendo seguido por
este caminho, a opção mais escolhida pelos defensores da vida é virar a cara ou
fechar o vidro para estes vagabundos.
Sua estratégia não dá certo, e
como é que haveria de dar? Os trocados ganhos de um carro ou outro não são
suficientes para o alimentar, quem dirá para resolver os problemas de um futuro
inteiro pela frente. Aos quatorze anos, cansado de apanhar, aquele feto
crescido não vê outra alternativa, decide então que está na hora de bater. Agora
ele é usuário de drogas, carrega uma pistola na mão e alguns delitos cometidos
em nome do desespero causado por toda uma existência sem direção, orientação,
base e estrutura.
É chegada a hora tão esperada
pelos amantes de pensamentos contraditórios, de pedir a prisão ou de aplaudir a
morte de mais um ladrãozinho miserável. É hora de clamar pela justiça! Uma
justiça injusta, que culpa e pune mais uma vítima social, que deseja que a
pátria elimine o indivíduo pelos erros cometidos pela própria pátria, a pátria
que o pariu, que o criou, e que não o deu outra escolha.
O que falta a estas pessoas é
perceber que, no fim das contas, demorou, mas a nossa pátria, longe de ser mãe
gentil, longe de ser justa, longe de ser “pró-vida”,
conseguiu realizar o aborto.
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